Para que o mundo seja do jeito que a gente quer, a mudança começa conosco, nos pensamentos, ações e sentimentos. Não adianta o ser humano ser bom, se ele tiver pensamentos negativos em relação a si e/ou ao próximo, ou reações tão negativas diante do negativo que reverte pra si o de pior. É necessário que sejamos uno em todas as nossas atitudes mentais, físicas, espirituais, pensar/agir/sentir da mesma forma, superando as diferenças e reagindo ao desconhecido sem pré-conceito, e colocando em prática a lei do amor. Quando conseguirmos juntar essas energias todas e nos tornarmos uno com o universo, teremos aprendido o que Jesus nos ensina, o que a vida nos testa, o que Deus quer de nós. Comunhão. textinho da Chris

segunda-feira, janeiro 18, 2010

Inteligências



Não é raro que se diga, quase como elogio, que alguém é uma pessoa complicada, mas inegavelmente inteligente. Também é frequente a menção, do mesmo modo como se fosse elogio, ao fato de que outrem não é muito inteligente, mas que seria uma “pessoa boa”.
Pensar essas coisas nos parece natural, eu mesmo já tive a pretensão de fazê-lo - por vezes, volto a ter. Mas será que é devido classificar publicamente os outros, negativa ou positivamente, com base na avaliação de algo tão difícil de aferir como a inteligência? Ou no julgamento de qualquer outro talento mental, mormente quando se nega o atributo, sabendo como os estereótipos podem tornar difícil a vida pessoal ou profissional de qualquer pessoa?
Pensando-se especialmente em caso de indivíduo com boa vontade e esforçado, pergunta-se: o que mais contribui para nossa evolução coletiva, um gênio preocupado apenas com suas necessidades ou alguém não tão brilhante que busque colaborar com o progresso de todos, utilizando seus conhecimentos para ajudar na busca do bem comum ou do próprio interlocutor?
Apesar de isto parecer óbvio, Kant, uma das mais brilhantes mentes da filosofia, deu-se ao trabalho de dizer que os talentos da mente, em si mesmos, não são bons ou ruins . E disse mais: é a boa vontade que torna alguém merecedor de felicidade; que a visão de um ser que não tenha uma única característica de pura boa vontade nunca poderá dar prazer a um espectador imparcial e racional.
Tentando formular um conceito – possivelmente de forma simplista -, vejo a inteligência como um talento mental que permite àquele que o tem melhor análise de certas informações que recebe, devendo-se levar em consideração que, como já não se discute, há inteligências diversas – lingüística, interpessoal, lógico-matemática etc.
Não há, aí, nesta definição improvisada, qualquer indicativo moral, e nem poderia haver, seguindo o que disse Kant. É a intenção que caracteriza os atos como bons. Consequentemente, o que devemos esperar é que os outros tenham boa vontade e que pratiquem aquelas condutas que poderiam ver transformadas em regra universal, com isso sendo demonstrado seu valor.
A inteligência revelada por alguém, assim, da mesma forma que outros talentos que podemos ter, se vista do ponto de vista das relações humanas, nada sinaliza quanto à personalidade de alguém - vista a personalidade não como algo imutável, admitindo-se de que as pessoas, salvo em casos patológicos, efetivamente podem mudar seus comportamentos.
Nada elucida, também, quanto ao grau de consideração que outrem deva merecer – se é que uma pessoa possa merecer mais consideração que outra.
Portanto, e supondo que, diante das diversas inteligências, possamos caracterizar alguém simplesmente como inteligente ou não – no que não acredito -, nada deve mudar, nas relações sociais, para alguém sem interesses pessoais menos nobres a alcançar, ter um ser mais ou menos inteligente ao seu lado, isso se levar em consideração o simples fato de ser o mais inteligente detentor de uma capacidade privilegiada de pensar sobre determinados aspectos.
É bem verdade que, não tivéssemos pessoas inteligentes na história da humanidade, talvez ainda vivêssemos em condições precárias. Afinal, foi a inteligência uma das características que nos permitiu posição de supremacia na natureza.
Ademais, é plenamente compreensível que, para algumas funções, por razões práticas, sejam buscadas pessoas com inteligência diferenciada, ou que consigam ter boa compreensão de assuntos diversos. A meritocracia, aliás, faz com que algumas posições sejam alcançadas em vista da inteligência e do conhecimento, este relacionado ao esforço.
Mas, ao menos na minha visão, a inteligência não é a mais nobre das nossas características.
Apesar disso, talvez pela necessidade de sobrevivência na nossa concorrida sociedade, talvez pelas possibilidades que a inteligência gera para quem a tem, que pode trabalhá-la de forma a alcançar posição de destaque para si e para quem o cerca em determinados ambientes, há quem ignore a existência dos que consideram simplórios. Ou os subestime.
O pior não fica aí.
Ocorre que, como indicado, a inteligência não se restringe àquela que permite o sucesso acadêmico, pela facilidade de absorver, reter e relacionar conhecimentos, mas também se revela pela habilidade social. Disso surge uma variante menos sofisticada desse atributo, a esperteza, naquela conotação tipicamente brasileira, que apela a instintos mais primários e permite, basicamente, a sobreposição de uns aos outros mediante o uso de expedientes questionáveis diversos, como a manipulação de opiniões e pessoas.
Nesse contexto, pelas expectativas que a sociedade gera, pela noção corrente de que o valor é menos importante que a dialética, que ganhar poder é um fim em si mesmo, é fácil vermos o quanto a idéia de que quem mais queira se dar bem do que fazer algo realmente bom se torna atrativa.
Mesmo reconhecida, repiso, a importância que as capacidades de analisar informações, de se comunicar, de escrever, dentre outras, têm para a maior parte das atividades e funções, parece-me que uma maior valorização das pessoas que buscam realizar o bem, mesmo que não tenham mente tão sagaz, que não sejam tão perspicazes, que não tenham a suposta habilidade de saber tudo a respeito das pessoas ao primeiro contato ou à primeira reação, é medida salutar. E não é demais lembrar que, por vezes, o excesso de preocupação em mostrar sagacidade leva a um estado de paranoia.
Deixo bem claro, se ainda há dúvida, que não faço apologia aos que têm dificuldade de elaborar raciocínios, ou mesmo à ignorância – esta tendo alguns partidários, que, esquecendo-se dos méritos de quem se esforça, mais se preocupam em atacar os estudiosos do que em saber a adequação do que dizem.
Pelo contrário, acho que algumas pessoas que revelam raciocínios menos elaborados podem fazer muito mal. Do mesmo modo, acho que a inteligência ajuda na educação, e esta é fundamental.
Mas educação que mereça ser assim chamada passa pela compreensão de que todos merecem tratamento igualitário, pela valorização do esforço e da boa-fé, que deveriam ser tão enaltecidos quanto o brilhantismo das idéias – ou a repetição de idéias decoradas.
O importante é que a inteligência, quando unida à boa vontade, em especial a uma boa vontade tão desinteressada quanto possível diante da nossa natureza e das nossas necessidades, pode permitir que sejam feitas grandes coisas em favor dos outros sem que ocorram os prejuízos colaterais normalmente relacionados à busca do sucesso pessoal a qualquer preço.
Para finalizar, saliento que, diante de muitas pessoas que trabalham na área do Direito, sinto-me bastante limitado, mas são notáveis o respeito e a capacidade que esses mestres têm de se adequar à capacidade de percepção de ouvintes como eu sem tornar possíveis diferenças barreiras entre todos. Há dois exemplos disso aqui no blog...
Não por acaso, a característica que essas pessoas acabam incentivando a adotar é o esforço de melhorar.
No caso de pessoas menos amigas, por outro lado, mesmo eventuais brincadeiras ou comentários que, usando técnicas de argumentação, ridicularizem as idéias expostas – comentários esses feitos perante o destinatário, permitindo direito de defesa – conseguem mostrar que o caráter educativo e democrático pode predominar, isso sem que se queira criar estamentos intransponíveis.
Tenho a crença de que, se valorizarmos todos que, com boa vontade, mostram esforço e dedicação, em qualquer atividade, ou mesmo na vida social, podem fechar-se alguns espaços para quem, achando merecer consideração mais elevada, vale-se da inteligência e da falta de escrúpulos para escarnecer, para destruir, para lucrar e para acabar com a auto-estima das pessoas, seja este último o objetivo visado ou não.

Dr. Paulo Eduardo Nunes de Ávila - Promotor de Justiça do
http://materiaespecializada.blogspot.com/


Kant’s Critique of Practical Reason and Other Works on the Theory of Ethics, trans. Thomas Kingsmill Abbott, B.D., Fellow and Tutor of Trinity College, Dublin, 4th
revised ed. (London: Kongmans, Green and Co., 1889), p. 39.


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